Irritado com decisão judicial que o censurou, o governador Roberto Requião (PMDB) suspendeu ontem a transmissão de uma reunião com prefeitos que havia chamado ao Palácio das Araucárias e deixou a emissora pública fora do ar, sem programação. Ele se disse e é, vítima de censura . O gesto inesperado abriu uma crise no Executivo paranaense, agravada com o pedido de demissão da procuradora-geral do Estado, Jozélia Nogueira Broliani, a quem Requião destratou em público.
A polêmica que levou o governador a tirar a Educativa do ar teve início em dezembro, quando o Ministério Público Federal propôs à Justiça ação civil pública contra ele e a direção da TV, sob alegação de que estaria utilizando a emissora com “desvio de finalidade” para criticar adversários. Os ataques de Requião ocorriam nas reuniões da Escola de Governo, nome do programa levado ao ar às terças-feiras, quando ele recebia prefeitos e secretários de Estado oficialmente para anunciar medidas de interesse público.
O Ministério Público pretendia que a Justiça tirasse imediatamente o programa do ar. O desembargador Edgar Lippmann Júnior, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, não concordou com a medida extrema, mas determinou ao governador que parasse com as críticas que atingiam até mesmo o Ministério Público e o próprio Judiciário.
Lippmann impôs, em caso de desobediência, multa de R$ 50 mil. Na reincidência, a sanção subiria para R$ 200 mil. Para o magistrado, os comentários do governador “transbordam, escancaradamente, os limites da função educativa da RTVE”.
Como parte da punição, a TV Educativa deveria pôr no ar ontem, a cada 15 minutos, uma manifestação da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) em defesa do Judiciário. Essa ordem partiu do próprio desembargador Lippmann.
A emissora exibiu durante todo o dia um slide com a marca da RTVE e, de tempos em tempos, surgia um pronunciamento do presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azêdo, a favor do governador.
Requião foi além. Mandou inserir a palavra “censurado” na programação, ressaltando as suas críticas à decisão judicial. Ontem, depois de suspender a transmissão, ele tratou aos berros a procuradora-geral do Estado, insatisfeito com a linha de defesa por ela adotada. Inconformada, Jozélia pediu demissão por meio de carta.
A assessoria de Requião informou que “a procuradora não tinha mais a confiança necessária para o cargo e ao sair apenas antecipou um processo de demissão que estava a caminho”. Segundo a assessoria, “não havia mais sintonia entre a procuradoria e o governo”. O novo procurador-geral é Carlos Frederico Marés de Souza Filho.
À tarde, o juiz federal Loraci Flores de Lima indeferiu pedido da emissora para tentar suspender a obrigatoriedade de divulgação da nota da Ajufe.
A Associação Nacional dos Procuradores da República considerou as reações de Requião como atos jocosos e de desrespeito à procuradora Antonia Lelia Sanches , que entrou com a ação, e a Lippmann: “Não se pode admitir que o governador utilize suas prerrogativas como chefe do Executivo para ferir a honra de membros de outros Poderes e órgãos independentes da República.”
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Paraná classificou de inaceitáveis as agressões verbais sofridas pela procuradora, mas lamentou a decisão judicial que obriga a RTVE a veicular nota de apoio a Lippmann. “A OAB considera necessário o resgate do equilíbrio, da serenidade e do respeito.”
A ÍNTEGRA DA CARTA
“Senhor Governador
Há algum tempo tenho percebido haver divergência de sua parte com relação a posturas corretas por mim adotadas, sempre pautadas na defesa do Estado do Paraná e do interesse público. Em inúmeras situações percebi sua incompreensão, o que fez subtrair, de minha parte ao menos, a indispensável segurança que deve haver por parte do chefe do Poder Executivo aos seus secretários de Estado.
Hoje pela manhã, contudo, senhor governador, Vossa Excelência superou-se. Em público, diante da imprensa e de todos os demais secretários de Estado, as agressões verbais ultrapassavam todos os limites de tolerância, de civilidade e, com todo respeito e sinceridade, de educação também.
Na certeza de ter pautado minha atuação institucional sempre de acordo com o interesse público, comunico a Vossa Excelência que estou deixando, neste momento, o cargo de procuradora-geral do Estado e todas as outras atribuições que me foram delegadas.
Retiram-se, também, das respectivas funções, a diretora-geral, a chefe de gabinete e a assessoria técnica.”
Jozélia Nogueira
Procuradora-geral do Estado
0 Comentários:
Postar um comentário