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14 de maio de 2010

Meta de inflação garantiu melhor saída da crise

Há fortes indícios de que os países que adotam o regime de metas para a inflação saíram melhor da crise global de 2008 do que os que não adotam essa política. Num texto intitulado "Metas de Inflação e a Crise: Uma Avaliação Empírica", Irineu de Carvalho Filho, economista do Fundo Monetário Internacional (FMI), faz uma cuidadosa análise comparada e conclui que os países com regime de metas se mostraram mais resistentes que os demais à turbulência.

Numa amostragem de 49 economias na qual 21 adotam o sistema de metas, ele encontrou dados que evidenciam que estes tiveram menor perda de produção industrial, recuperaram-se mais rapidamente do desemprego, evitaram a deflação e foram capazes de reduzir as taxas nominal e real de juros mais do que os que não operam com ele.

No Brasil, o regime de metas também passou pelo teste da grande crise. Mas, mesmo com a demora do Banco Central em reduzir a taxa básica - que só começou a cair em janeiro de 2009, o que foi muito criticado - a inflação, que em vários países se converteu em deflação, aqui ficou acima da meta de 4,5%. O IPCA, no pior ano desde a Grande Depressão, foi de em 5,9%, mostrando uma força intrigante.

Para lidar com o sistema de metas, um dos pressupostos é que o BC tenha alguma autonomia. Não independência, porque esta significaria ter poder até para escolher a meta, o que não é o caso.

Aqui, ela é definida pelo presidente da República, aprovada pelo Conselho Monetário Nacional e, ao BC cabe cumprir a tarefa de levar a inflação para o alvo, com salvaguardas para acomodar choques de oferta e bom-senso de, em nome de uma trajetória de desinflação, não afundar o país na recessão.

A discussão que se estabeleceu nos últimos dias sobre inflação, juros, democracia e autonomia do BC tem o viés ideológico próprio da luta política mas, também, um certo grau de resistência ao modelo.

Não cabe ao BC decidir qual a inflação que a sociedade deseja: esta será definida pelo presidente eleito. Ao fixar a meta de inflação, ele terá considerado várias das premissas básicas, como o crescimento que a economia suporta com aquela taxa inflação e a criação de empregos que esse crescimento poderá gerar, entre outras.

A diretoria do BC também é escolhida pelo presidente, avalizada pelo Senado e pode ser demitida a qualquer momento. Consolidou-se, no país, a ideia da autonomia concedida, não formalizada em lei.

Esse é um tema relevante, pois as decisões do BC afetam a todos. Ele é o principal responsável pela estabilidade da economia e isso não é pouco. Quando o pré-candidato à presidência pelo PSDB, José Serra, em entrevista à rádio CBN, disse que o BC não é a Santa Sé, intocável, não jogou luz no debate.

No dia seguinte, novamente abordado sobre o tema, Serra mencionou que, se eleito, adotará um modelo de coordenação da política macroeconômica em que a diretoria do Banco Central discutirá com o Ministérios da Fazenda e do Planejamento o curso da política econômica. Essa pode ser uma boa iniciativa. Como disse certa vez o ex-presidente do BC Armínio Fraga, não é possível chegar a bom termo se enquanto um liga a calefação, o outro aciona o ar refrigerado. Ou, não se pode esperar que os juros baixem se a política fiscal é expansionista num momento em que a inflação ameaça.

Ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, resolveu dar uma ajuda ao BC para que os juros não cuidem, sozinhos, de conter a elevação dos preços. Anunciou um corte de R$ 10 bilhões nos gastos do governo para reduzir a pressão do setor público sobre o crescimento que se dirige a 7%.

A discussão sobre o porquê de o país ter, por longos anos, as maiores taxas de juros do mundo é legítima e necessária na campanha eleitoral e fora dela. Ao mesmo tempo, seria oportuno neste momento também definir que tipo de Banco Central se quer ter. Uma autonomia legal, por exemplo, deveria estabelecer direitos e deveres e, na lista das obrigações, caberia impor limites ao BC para criar gastos fiscais seja com a política cambial, de crédito ou de socorro ao sistema bancário.

Países com regime de metas para a inflação, caso se confirme a tese do economista do FMI Irineu Carvalho Filho, foram mais resilientes na crise mundial e isso se traduziu em menos prejuízos ao seus povos. Nesse sistema, a base é a coordenação das expectativas dos agentes econômicos. Os juros são o principal instrumento e a credibilidade do BC contribui para mitigar o custo da estabilização.

A questão da autonomia dos bancos centrais surgiu, no mundo, da constatação de que os políticos, em geral, buscam a reeleição e, para isso, tendem a preferir políticas monetárias expansionistas (com juros baixos) no curto prazo, mesmo que às custas de mais inflação.

O poder sobre a moeda nunca foi assunto pacífico no país. Foram 20 anos de discussão para se criar o BC e outro tanto para ele ser a única autoridade monetária do país.

A alegação de que a diretoria do BC não tem representatividade política para preservar o poder de compra da moeda carece de fundamento à medida que a autonomia operacional é somente uma delegação de poderes conferida pelo presidente da República e pelo Senado.

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