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17 de março de 2008

Um Congresso sem identidade


O Legislativo foi palco de uma verdadeira guerra nos últimos dias, particularmente no Senado. Parlamentares quase chegaram ao conflito físico. Discursos emocionados, uma oposição descontrolada e governistas exultantes marcaram presença numa semana que terminou com a votação de projetos importantes. A maioria dos analistas afirmou que o Executivo venceu a batalha. Em parte, isso é correto. Mas a melhor definição do resultado desse jogo é que a derrota foi maior que a vitória. E o grande derrotado foi o Congresso como instituição.

Se os congressistas quiserem recuperar credibilidade e atacar o excessivo poder do Executivo, não podem deixar que o ano comece sem um Orçamento aprovado. A peça orçamentária é a principal bússola que a sociedade tem para saber o que o governo faz com seu dinheiro. Pode-se retrucar que o atraso se deveu a um fato extemporâneo: a derrubada da CPMF no fim de 2007. Só que essa não é a primeira vez – e, se nada mudar, não será a última – que isso ocorre. No governo FHC, petistas e governistas rebeldes chegaram a aprovar o Orçamento quase no meio do ano – os membros do PT querendo enfraquecer o presidente, os aliados procurando barganhar mais recursos para suas bases.

Em vários países, se não há Orçamento votado até certa data, o governo pode até parar. E se acontecesse isso no Brasil? Idosos sem suas aposentadorias, hospitais sem recursos para remédios e uma série de outras calamidades. Quem seria o responsável? Chegamos aqui a uma solução de compromisso que permite que determinados gastos continuem, mesmo sem a aprovação do Orçamento. Evita-se assim a catástrofe, porém se mantém a prática irresponsável de prorrogar ao máximo a votação da destinação exata das verbas públicas. É mais um “jeitinho brasileiro”, que serve para alimentar os conflitos entre oposição e governo, bem como as barganhas dentro da base aliada, mas cujo resultado final é sempre o mesmo: o Orçamento aprovado pelo Congresso é só autorizativo. Dá ao Executivo ampla margem para realizar as despesas.

O caso das medidas provisórias manifesta o mesmo DNA. Líderes congressuais reclamam, com razão, da enxurrada de MPs que o Executivo tem editado. Mas esse processo só permanece porque o próprio Congresso o alimenta. Do lado dos governistas, já não basta aprovar essas medidas. Em alguns casos, deputados e senadores da situação “derrubam” uma MP para facilitar a votação de outra legislação de interesse do governo. Admitem, com isso, que a medida anterior não era urgente e relevante.

Da parte da oposição, a protelação da votação das MPs é, normalmente, uma forma de tentar atrapalhar o governo. Quando não conseguem mais fazer obstrução e percebem que vão perder no voto, fazem um escândalo teatral, como na semana passada. Em vez disso, poderiam lutar para aprimorar a legislação enviada pelo Executivo. Isso poderia ter sido feito no caso da MP da TV Pública, cujo desenho institucional poderia ter sido aperfeiçoado, com ganhos para a sociedade.

Como todas as forças políticas relevantes já passaram pelo Palácio do Planalto, chegou a hora de seus líderes mais responsáveis mudarem o que precisa ser mudado: o rito orçamentário e o trâmite das MPs. Devem abandonar uma postura oposicionista juvenil sem caminhar para o comportamento subserviente da maioria dos governistas. Diante da balbúrdia no Senado, o presidente da Casa, Garibaldi Alves, resumiu com maestria o Congresso atual: “Me desculpem, mas este não foi o Senado que sonhei presidir. Este não é o Senado que a opinião pública espera que vote as transformações de que o país precisa”.

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