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25 de abril de 2008

A oposição sonha com a Portelinha


A vida da oposição seria mais fácil se o Brasil fosse uma imensa Portelinha.

A vida seria mais fácil para a oposição se o Brasil fosse assim uma imensa Portelinha. Na favela da televisão, ninguém deve nada ao governo, nem mesmo a ONG da Condessa. Os pobres pedem favores ao manda-chuva Juvenal Antena, e não se fala em Bolsa-Família. O cuca Bernardinho montou seu restaurante sem a ajuda do crédito consignado ou de bancos oficiais. A universidade particular de dona Branca recebe dinheiro de beneméritos e não dá bolsas do ProUni. Lá, na Portelinha, bandido é bandido e deputado é mocinho. Nem precisa bater ponto em Brasília para garantir o mandato e fazer obstrução.

No Brasil de verdade, a oposição está diante de uma montanha de obstáculos que não se vê na novela. O leitor não se iluda: quem apanha todo dia, nos discursos no Congresso e nas notícias, é o governo velho de guerra (é assim desde sempre), mas quem vive uma crise profunda, de identidade inclusive, é a oposição. Fora do poder há cinco anos, PSDB e DEM viram aliados aderir a Lula, perderam as bases eleitorais no Nordeste e precisam defender, nas eleições municipais, as grandes cidades do Sul e do Sudeste que estão sob seu comando.

Oito cardeais do PSDB e do DEM reuniram-se em São Paulo, na semana passada, para discutir os rumos da oposição. Do que transpirou do encontro, falaram tão mal do governo quanto uns dos outros. Segundo o relato oficial, concluíram que o PT é o adversário a ser derrotado nas eleições de 2010. É bom avisar, porque nem parece. Os dois únicos políticos da oposição em condições de levar a tarefa adiante – José Serra e Aécio Neves – não estavam na reunião. Isso dá a medida da distância entre intenção e realidade. Mais ou menos a mesma entre o país e a novela.

O mundo da oposição tem-se resumido a Brasília, onde sustenta contra o governo uma guerra de desgaste na trincheira do Senado. Graças à contribuição milionária de todos os erros (como dizia o poeta Oswald de Andrade) do Planalto e do PT, vem obtendo relativo sucesso nesse terreno. Chegou a impor uma grande derrota a Lula em dezembro, na votação que acabou com a cobrança da CPMF. “De que adiantou aquele esforço se não ganhamos as ruas com o resultado?”, pergunta-se o líder tucano Arthur Virgílio. “De que adiantou se nem meus companheiros me cumprimentam pela vitória?”

Na favela da TV não existem os obstáculos que PSDB e DEM não conseguem transpor na vida real

Arthur Virgílio é uma das vozes mais estridentes da oposição. Gente do governo diz que ele é um maluco incendiário. Gente da oposição também acha. Pediram para ele falar menos. Ele acha que os colegas precisam falar mais. “Temos companheiros imaginando como seria nossa volta ao governo no pós-Lula, quando ainda nem aprendemos a fazer oposição”, diz. “Temos sido presunçosos e arrogantes, diante de um adversário iletrado, mas esse iletrado nos aplicou duas surras de 40 milhões de votos”.

Há uma centelha de lucidez na fala do senador, além da autocrítica. Arthur Virgílio quer ver sua gente na rua. “Deveríamos estar no sul do Pará, escancarando a falta de autoridade do governo diante do atrevimento do MST”, dizia na semana passada, quando militantes dos sem-terra bloqueavam a ferrovia da Vale em Carajás. Fazer isso – e carregar idéias para melhorar o país – seria mais útil à oposição que tentar proibir o presidente Lula de fazer inaugurações em comícios país afora, como pede uma ação judicial movida pelo DEM.

Enquanto não se acertar internamente e não acertar seu discurso para o país real, a oposição vai ficar assistindo à novela, na qual quem abusa do cartão corporativo devolve o triplo do que gastou. Parece que roubaram o caixa dois do Juvenal Antena. Isso deve equilibrar a disputa eleitoral. Lá na Portelinha.

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